Elegia Pataxó

Não foi o dia, desta vez,
que nasceu no grito inocente
dos pássaros, nem na sirene,
tampouco, dos grilos silvestres.


Não foi de festa, igualmente,
a explosão de súbita chama,
veloz, perfurando as retinas
e voraz entrando no tórax.


Não eram as gralhas, nhambus
ou araras que de repente
chegavam, pondo-se em pânico
e se atirando contra as trevas.


As íngremes nuvens de inverno,
pesadas, vãs, mal entendiam
o trêmulo apelo dos lábios
em torno do tempo distante.


Ruídos, ruídos, ruídos
depressa se acercam da língua
e, num instante, já não deixam
lugar pra soltar, desfazer
o nó que entope a garganta.


Estrelas, tão tímidas sempre,
agora se inflam, atritam-se
e expelem odor de veneno,
como se urrassem as feras
ante a iminência da morte.


Que flechas se quebram na pele,
as pernas perdidas do corpo,
as mãos segurando ainda
um recado não dado e a força
que foge de dentro dos olhos?


Imagine:
há quinhentos anos o vento
soprando e inflando este fogo
contrário, o sol às avessas,
e a bruma deitando no verde
das folhas as cinzas miúdas!

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